Prazeres pela Metade.

Texto de Leila Ferreira (adaptado)
*Jornalista,apresentadora de TV, escritora. Mineira de Araxá, ex- Globo, atual TV Minas

 
"Não há nada que me deixe mais frustrada do que pedir sorvete de sobremesa, contar os minutos até ele chegar e aí ver o garçom colocar na minha frente uma bolinha minúscula do meu sorvete preferido - uma só. Quanto mais sofisticado o restaurante, menor a porção da sobremesa.
Aí a vontade que dá é de passar numa loja de conveniência, comprar um litro de sorvete bem cremoso e saborear em casa com direito a repetir quantas vezes a gente quiser, sem pensar em calorias, boas maneiras ou moderação. O sorvete é só um exemplo do que tem sido nosso cotidiano. A vida anda cheia de meias porções, de prazeres meia-boca, de aventuras pela metade. A gente sai pra jantar, mas come pouco. Vai à festa de casamento, mas resiste aos bombons.
Adora tomar um banho demorado, mas se contém pra não desperdiçar os recursos do planeta. Tem vontade de ficar em casa vendo um DVD, esparramada no sofá, mas se obriga a ir malhar.
E por aí vai. Tantos deveres, tanta preocupação em 'acertar', tanto empenho em passar na vida sem pegar recuperação.... Aí a vida vai ficando sem tempero, politicamente correta e existencialmente sem-graça, enquanto a gente vai ficando melancolicamente sem tesão. Às vezes, dá vontade de fazer tudo 'errado' - deixar de lado a régua, o compasso, a bússola, a balança e os 10 mandamentos. Ser ridícula, inadequada, incoerente e não estar nem aí pro que dizem e o que pensam a nosso respeito. Recusar prazeres incompletos e meias porções.
Até Santo Agostinho, que foi santo, uma vez se rebelou e disse uma frase mais ou menos assim: 'Deus, dai-me continência e castidade, mas não agora'. Nós, que não aspiramos à santidade e estamos aqui de passagem, podemos (devemos?) desejar várias bolas de sorvete, bombons de muitos sabores, vários beijos bem dados, a água batendo sem pressa no corpo, o coração saciado."
Confecei ontem ao meu amigo que até bem pouco tempo atrás obrigava-me a ficar cotando e pesquisando as coisas que eu queria comprar para ter a certeza de que estava fazendo o melhor negócio. E naquela época meu sonho era poder comrar as coisas sem ter que pesquisar muito...do tipo: gostou? Compra e pronto (depois a gente vê o que dá!!!....Foda-se!) Obviamente ainda não consigo fazer isso ao extremo, pois ao mesmo tempo me irrito a descobrir que comprei algo e logo em seguida vejo outra coisa muito melhor, mais interessante e barata. Planejar o futuro, também é muito importante. Como sempre digo, a virtude está no meio termo...com direito a excessos e contenções. Uma coisa eu posso dizer: Sou muito mais feliz agora!
Bjs